Escolha do 8 de março está ligada a mobilizações de mulheres na Revolução de Fevereiro de 1917, na Rússia
Dafne Melo,
da Redação do Brasil de Fato
03/03/2010
Por muito tempo acreditou-se que a escolha do 8 de março para ser o Dia Internacional das Mulheres foi devido à um incêndio em uma fábrica têxtil nos Estados Unidos que vitimou cerca de 150 trabalhadoras que organizavam uma greve contra às más condições de trabalho. Até mesmo militantes do movimento feminista aceitavam essa explicação. Desde a década de 1970, entretanto, novas pesquisas nessa área têm apontado que a escolha da data está ligada à história da Revolução Russa. “De fato houve esse incêndio nos EUA, um acontecimento trágico para o movimento sindical e feminista na época, mas o incêndio sequer teria ocorrido nessa data”, explica Tatau Godinho, militante da Marcha Mundial de Mulheres.
Ela explica que hoje se tem comprovado pelos documentos que a orientação para se realizar as comemorações e manifestações internacionais se deu em 1910, numa resolução da Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, na Rússia, e que não havia uma indicação de data fixa para a comemoração. A reivindicação central seria o direito ao voto para as mulheres. Até a década de 1920 do século passado, as feministas realizaram as lutas em diferentes datas em seus países. Somente em 1922, após a Conferência Internacional das Mulheres Comunistas é que foi sugerida a data do 8 de março.
Revolução russa
No antigo calendário ortodoxo russo, o 8 de março corresponde ao 23 de fevereiro, data que marca o início da primeira fase da Revolução Russa, na qual o czar Nicolau II renunciou ao poder e a Rússia adotou um regime republicano. “As mulheres tiveram um peso muito grande nas mobilizações de fevereiro. Há registros de uma grande greve coordenada pelas operárias do setor têxtil que teria iniciado essas agitações; elas pediam o fim da participação da Rússia na I Guerra Mundial, a volta dos militares para suas casas, e pão”, explica Tatau. Essas mobilizações estavam, inseridas dentro das comemorações do Dia da Mulher e se davam em um momento em que o país estava mergulhado em uma crise política e era seriamente atingido pela fome.
Alguns dos líderes da revolução fazem referência direta ao fato em seus textos. “O dia das trabalhadoras em 8 de março de 1917 foi uma data memorável na história (…) A Revolução de fevereiro começou nesse dia”, escreveu a dirigente feminista Alexandra Kollontai. Leon Trotski, na obra “História da Revolução Russa”, comenta que ninguém poderia prever que o Dia da Mulher pudesse inaugurar a revolução, desencadeando uma greve de massas.
Resgate
Para Tatau Godinho, resgatar a verdadeira origem do 8 de março é importante por inúmeros motivos. Primeiro, mostra como a luta das mulheres pode e deve caminhar junto com a luta por transformações sociais mais profundas. Segundo, resgata a data como um momento de luta e organização das mulheres socialistas, devolvendo à comemoração seu conteúdo político. Também por esses motivos não é difícil imaginar porque a memória histórica hegemônica aceitou e propagandeou a versão do incêndio da fábrica têxtil nos EUA, e escondeu sua origem socialista. “Há um esforço de institucionalização e comercialização da data que coincide com um certo refluxo do movimento de mulheres socialistas, o que começa a se reverter na década de 1970, quando se começa a surgir o interesse na verdadeira origem da escolha da data”, finaliza Tatau.
Nenhum comentário:
Postar um comentário